Por Maurette Brandt, Colunista de Plurale
Nana Caymmi - 26° Prêmio da Música Brasileira 2015, no Theatro Municipal, no Centro do Rio de Janeiro/RJ. (10/06/15) Foto: Roberto Filho/Divulgacão
Nana fala comigo enquanto o disco de vinil, impecavelmente conservado, dá suas mágicas voltas no prato da vitrola novinha, que acaba de restaurar meu prazer de ouvir música.
Nana Caymmi apenas continua uma conversa de anos, após a dura notícia de que a artista nos deixou, após uma longa internação hospitalar.
Uma voz que ecoava trovões em meio à delicadeza: Nana era isso, entre pianíssimos e convulsões extremamente musicais. Trazia, para cada canção, aquele timbre pessoal e intransferível que nos oferecia uma viagem única. A sensação que eu tinha era a de possuir um tesouro - uma porta secreta para uma beleza particular, que não era só pra mim, mas que parecia ser. Era sempre assim que eu me sentia sempre que tirava o disco da capa interna de plástico e botava pra tocar. E assim ouvia todos os segredos, até a última faixa, de um lado e do outro.
No tempo que eu participava do Coral CSN, em Volta Redonda, havia um projeto magnífico chamado CSN in Concert, que convidou vários artistas brasileiros pra participar. De Moraes Moreira a Altamiro Carrilho, Bete Carvalho, Ivan Lins e, entre tantos, Nana Caymmi.
Difícil para este ser humano, na fila dos contraltos, compartilhar o palco com uma musa de tal envergadura sem entrar num estado, digamos, de verdadeiro encantamento.
Tudo isso aconteceu numa inesquecível transversal do tempo, vivida quase que de roldão. E lá estava ela, radiante, acompanhada pela Banda Sinfônica da CSN e do Coral CSN, sob a regência do maestro Marcelo Jardim.
-:Eu sou uma siderúrgica!!! - declarou, ao dirigir-se ao público, com sua natural irreverência.
(Pus-me então a imaginar Nana em meio às labaredas do cadinho do Alto-Forno, uma imagem que me era cotidiana, mas que é difícil de descrever para quem nunca viu).
Naquele palco e com aquela voz tão particular, com o calor musical que lhe coube como herança de todos os talentos familiares, Nana Caymmi cantou para um cinema Nove de Abril lotado, imerso naquele turbilhão musical e poético que só ela, unicamente ela, era capaz de produzir.
Entender Nana, seja por meio da voz e da presença, pelas entrevistas na TV e pelas declarações muitas vezes controversas, sempre foi caminho incerto. É por isdo que, ainda sob o vácuo dessa ausência desabrida, prefiro sentir Nana Caymmi - a artista sensível, a mãe incansável e a pessoa muitas vezes incompreendida - por toda a beleza que sua arte acrescentou à minha vida, e que me ajudou a entender mais profundamente a música deste país, desde o universo de Dorival Caymmi até a vanguarda da MPB, que ela cantou e promoveu divinamente.
Segue em frente, divina Nana, entre as notas musicais e a intensidade da palavra, com a mesma alegria e a emoção que tão generosamente soube dividir com todos nós.